Em “Up in the Air” George Clooney representa o papel de um executivo cuja profissão é despedir pessoas, em empresas espalhadas pelos Estados Unidos. Naturalmente esquivo a todo o tipo de compromisso e desprezando as conveniências sociais, a personagem tem um lema - “Moving is living”. Assim, faz das viagens o seu universo, do aeroporto a sua casa e da itinerância o seu modo de vida. “Last year I spent 322 days on the road. Which means that I had to spend 43 miserable days at home.” Até ao dia em que a realidade o apanha e o afasta da sua zona de conforto, obrigando-o a repensar os seus objectivos e motivações.
O argumento (da autoria de Jason Reitman e Sheldon Turner) é brilhante e surpreende a vários níveis, servindo optimismo e cinismo em doses iguais.
Não sendo este um blogue de cinema, o que me leva a falar deste filme é a relação peculiar que o protagonista tem com os aeroportos. É talvez a vertente mais banal do filme, mas mesmo assim produz momentos inesquecíveis para quem – e passo o chavão – viajar é como respirar.
É inevitável não sorrir ao vê-lo fazer a mala. Toda a roupa bem dobrada e arrumada, sem hesitações, em compartimentos próprios, num trolley com as medidas exactas da bagagem de cabine. O mesmo é fechado sem que seja preciso fazer qualquer pressão adicional e, sem excesso de peso, desliza pelo aeroporto como um automóvel de F1. Uma lição para quem, como eu, fazer a mala é uma dor de cabeça.
Deliciosa é a cena da passagem pelos controlos de segurança. É como assistir a um bailado minuciosamente coreografado. Abre a mala e tira o portátil, coloca-o num tabuleiro separado das chaves e do telemóvel, descalça-se, mostra o bilhete, passa no detector de metais e, do outro lado, volta a colocar tudo na ordem inicial. Com precisão e harmonia, cada mão ocupada com tarefas diferentes, trabalhando para o mesmo objectivo. A eficácia em movimento.
Nem mesmo a escolha da fila em que se coloca é feita ao acaso."Never get behind people travelling with infants. I’ve never seen a stroller collapse in less than 20 minutes. Old people are worse. Their bodies are littered with hidden metal and they never seem to appreciate how little time they have left on Earth. [...] Asians. They are light packers, treasure efficiency and have a thing for slip-on shoes. God love’em.”
Desafio o leitor a não pensar desta forma da próxima vez que tiver de atravessar um controlo de segurança. Franzindo o sobrolho perante tal hino ao politicamente incorrecto... naturalmente!
Em voz-off, a personagem vai-nos brindando com pérolas como:
“ All the things you probably hate about airports – the recycled air, the airtificial lighting, the digital juice dispensers, the cheap sushi […] are the warm reminders that I am home.”Dispenso o sushi e os sumos, mas o ar reciclado e a luz artificial ajudam a fortalecer a aura mística que os aeroportos têm para mim: o ponto de partida para aventuras em terras distantes e exóticas.
Porém, parte do prazer de viajar é saber que temos para onde regressar. Um porto seguro, onde descansar (sim, mais um chavão...!). Depois do contacto forçado com "o mundo exterior", tendo falhado na tentaiva de "assentar", a personagem regressa à realidade errática que sempre conheceu. Mas já não encontra nela qualquer consolo.
"Tonight, most people will be welcomed home by jumping dogs and squealing kids, their spouses will ask about their day and tonight they’ll sleep. The stars will wheel forth from their daytime hiding places, crowning their neighborhood with lights. And one of those lights, slightly brighter than the rest, will be my wing tip, passing over."
Foto: from Up in the Air
As minhas desculpas aos eventuais leitores que se sintam defraudados pelo facto do texto não ser tão excitante como o título o faria prever... ;)
Foto: from Up in the Air
As minhas desculpas aos eventuais leitores que se sintam defraudados pelo facto do texto não ser tão excitante como o título o faria prever... ;)