Das mãos negras pendiam colares e pulseiras, feitos de contas coloridas, que já víramos tantas vezes por estas paragens. A sua parlapatice era igual à de tantos outros vendedores com quem nos cruzáramos e, quando se apercebeu do nosso desinteresse pela mercadoria, foi com a habitual pergunta que nos tentou cativar:
- Where are you from?
- Portugal, respondi.
Mas, desta vez, a resposta, a que também já nos acostumámos ("ah... Cristiano Ronaldo"), fez-se tardar. O jovem olhou para nós, em silêncio, perplexo.
Fiquei contente. Acho que até sorri, triunfante. Prefiro que este jovem desconheça por completo o meu país, em vez de o associar, automaticamente, a um arrogante pontapeador de bolas...
O meu sorriso, contudo, foi-se desvanecendo à medida que ouvia a sua resposta, pronunciada num inglês pobre mas confiante:
- Yes... I know Portugal. Cristiano Ronaldo … plays in Madrid now.... Maniche and .... Nuno Gomes .... and Miguel... he plays in Valencia.
Não pudemos deixar de rir, estupefactas perante tão profuso conhecimento futebolístico.
A atitude do jovem também se alterou. Para ele, deixámos de ser mais umas mzungus (brancas) a quem impingir artesanato. Tomámos estatuto de deusas, nascidas na terra que gera heróis capazes de tantas e excitantes proezas com uma simples bola mágica.
Entretanto, outros vendedores aproximaram-se do jeep e tentam chamar a nossa atenção, gritando "Holá, señoritas".
Com um inabalável "no spanish", o fã de Ronaldo fechou a janela e virou-se de costas para o jeep, afastando os vendedores com a sua postura protectora. E assim ficou, qual guardião de um templo proibido, até à nossa partida.